“Estavas, linda Inês, posta em sossego,De teus anos colhendo doce fruto,Naquele engano da alma, ledo e cego,Que a fortuna não deixa durar muito,Nos saudosos campos do Mondego,De teus fermosos olhos nunca enxuto,Aos montes ensinando e às ervinhasO nome que no peito escrito tinhas. “Do teu Príncipe ali te respondiamAs lembranças que na alma lhe moravam,Que …
Literatura
A experiência humana – com suas descobertas, dores e angústias – é objeto central da literatura. Nas palavras de escritores e seus personagens, encontramos a expressão de todos os tipos de sentimentos. Ler é algo que nos amplia, nos provoca e nos acolhe. Aqui apresentamos trechos de obras literárias em língua portuguesa que, de várias maneiras, se relacionam com o que estamos vivendo.
Como o agora nunca cessa, essa área será constantemente ampliada a partir de contribuições de editoras e escritores parceiros do Museu da Língua Portuguesa.
Euclides da Cunha
Desce a noite, sem crepúsculo, de chofre — um salto da treva por cima de uma franja vermelha do poente — e todo este calor se perde no espaço numa irradiação intensíssima, caindo a temperatura de súbito, numa queda única, assombrosa… Ocorrem, todavia, variantes cruéis. Propelidas pelo nordeste, espessas nuvens, tufando em cúmulos, pairam ao …
Monteiro Lobato
A vida, Senhor Visconde, é um pisca-pisca.A gente nasce, isto é, começa a piscar.Quem pára de piscar, chegou ao fim, morreu.Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso.É um dorme-e-acorda, dorme-e-acorda, até que dorme e não acorda mais.A vida das gentes neste mundo, senhor sabugo, é isso.Um rosário de piscadas. Cada pisco …
Lima Barreto
Não há como um cidadão pacato, bem comido, tendo tomado alguns vinhos generosos, para apreciar as narrações de guerra. Ele só vê a parte pitoresca, a parte por assim dizer espiritual das batalhas, dos encontros; os tiros são os de salva e se matam é coisa de somenos. A Morte mesmo, nas narrações feitas assim, …
Fernando Pessoa
A morte é a curva da estrada,Morrer é só não ser visto.Se escuto, eu te ouço a passadaExistir como eu existo.A terra é feita de céu.A mentira não tem ninho.Nunca ninguém se perdeu.Tudo é verdade e caminho. Fernando Pessoa (1888-1935).
Machado de Assis
Os espíritos, disse ele, nascem condores ou andorinhas, ou ainda outras espécies intermediárias. A uns é necessário o horizonte vasto, a elevada montanha, de cujo cimo batem as asas e sobem a encarar o sol; outros contentam-se com algumas longas braças de espaço e um telhado em que vão esconder o ninho. Estes eram os …
Florbela Espanca
IMPOSSÍVEL Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste:“Parece Sexta-Feira de Paixão.Sempre a cismar, cismar de olhos no chão,Sempre a pensar na dor que não existe …O que é que tem?! Tão nova e sempre triste!Faça por estar contente! Pois então?! …”Quando se sofre, o que se diz é vão …Meu coração, tudo, calado, ouviste …Os meus …
Emílio de Meneses
GERMINAL Passou. A vida é assim: é o temporal que chega,Ruge, esbraveja e passa, ecoando, serra a serra,No furioso raivar da indômita refregaQue as montanhas abala e os troncos desenterra.Mas o pranto, afinal, que essa cólera encerraTomba: é a chuva que cai e que a planície rega;E a cada gota, ali, cada gérmen se apegaFecundando, …
Eça de Queiroz
Carlos, no entanto, ficara em frente do velho, sem chorar, perdido apenas no espanto daquele brusco fim! Imagens do avô, do avô vivo e forte, cachimbando ao canto do fogão, regando de manhã as roseiras, passavam-lhe na alma, em tropel, deixando-lha cada vez mais dorida e negra… E era então um desejo de findar também, …
Fernando Pessoa
A PARTIDA Meu amor perdido, não te choro mais, que eu não te perdi!Porque posso perder-te na rua, mas não posso perder-te no ser,Que o ser é o mesmo em ti e em mim.Muito é ausência, nada é perda!Todos os mortos — gente, dias, desejos,Amores, ódios, dores, alegrias —Todos estão apenas em outro continente…Chegará a …