
A pesar, as dores.
A pesar, a invisibilidade.
A pesar, isto que não se diagnostica nos olhos das máquinas científicas.
A pesar, tudo.
Apesar de tudo,
Ele.
No canto do urutau, nessa morte viva, faço-me anoitecer, recolhida por entre minhas penas que não conseguem alçar voo.
Tomo da sua respiração a mais de 50 metros de profundidade para poder voltar à superfície diluindo-me em fragmentos cintilantes, junto à palma das suas mãos, nos entrelaçares dos dedos.
Vejo o dilatar de sua pupila acesa, e nela procuro um fio de seda entre as linhas largas que se desenham na geometria dos seus olhos.
Em fios transparentes, choro golfadas de lágrimas lama.
Uma grande aranha habita meu córtex frontal, e se expande nos emaranhados de fios produzidos pelos encontros elétricos dos neurônios ao som do urutau.
A me pesar, esse canto,
os fios, a aranha.
Pesar sobre ele o meu pesar.
A pesar, tudo.
Apesar de tudo:
Ele.
Deborah Brum, Cotia (SP)